A justiça do trabalho lida com muito mais que apenas erro na rescisão do contrato de trabalho ou no pagamento das horas extras, dúvida? Vou te dar um exemplo, dano moral!

Olha só, sabe quando você sofre com piadas ou comentários no local de trabalho? Se o empregado não faz nada para evitar isto, você sofreu um dano moral.

Seu superior, no caso das mulheres, fica tendo um comportamento duvidoso, faz piadas de mal gosto, tem uma conversa suspeita, pois é, além do assédio sexual, isto também é uma forma de dano moral.

Você não sabia disso?

Não se preocupe, MUITOS trabalhadores desconhecem! Muitos sofrem calados, achando que isso é normal e que deve ser tolerado, mas isso só acontece por falta de informação e, principalmente, por falta de uma empresa ativa na proteção de seus colaboradores, que não busca resolver os problemas.

Ora, para a justiça do trabalho, existem vários tipos de danos aos quais os empregadores estão sujeitos, esses exemplos que eu falei acima, são considerados como dano moral decorrentes da relação de trabalho, são também chamados de danos extrapatrimoniais.

Ou seja, os trabalhadores contam com a proteção do direito – e aqui me refiro a ciência como um todo e não um direito em específico – para assegurar um tratamento digno e respeitoso, quer seja pela empresa, quer seja pela sociedade, quer seja por todas as pessoas do Brasil.

Esse tipo de dano, é aquele que atinge a intimidade da pessoa, do trabalhador, são os direitos de personalidade que eu, você e todo mundo precisa respeitar. Eles estão ligados à pessoa, não apenas ao patrimônio, ao dinheiro, dizem respeito ao íntimo do ser, parece confuso, mas eu vou te mostrar que não.

É interessante lembrar já de início, que esses direitos de personalidade são impossíveis de serem “negociados”, ou seja, de acordo com o artigo 11 do Código Civil[1], são intransmissíveis e irrenunciáveis, não sofrendo limitação voluntária.

Podemos definir os direitos de personalidade como inatos – são reconhecidos a todas as pessoas pelo simples fato de existirem – absolutos – são obrigações de não fazer – extrapatrimoniais – não tratam de dinheiro, ainda que a lesão  gere um conteúdo econômico – indisponíveis – não mudam de pessoa mesmo que esta seja a vontade do agente – imprescritíveis – não possuem um prazo para serem exercido – e, finalmente, são impenhoráveis e inexpropriáveis – não podem sofrer qualquer tipo de penhora.

Mas porque estou falando disto?

Ora, para você entender que o dano moral é aquilo que você sente quando sofre algum evento, quando você passa por alguma situação.

Pode parecer difícil de verificar sua existência na área trabalhista, vou trazer um exemplo do direito do consumidor, para ficar mais fácil de notar sua importância e sua extensão.

Suponhamos que você compre uma televisão nova, do último modelo, com tantas siglas que mais parece um idioma alienígena, pois bem, ao instalar ela na sua casa, você percebe que ela não liga, mesmo tendo sido retirada agora da caixa. Neste momento qual será sua reação? Qual será o seu sentimento?

É aí que nasce o dano moral! É esse sentimento, esse abalo, esse constrangimento que o direito chama de dano moral, por isso as suas características alguns parágrafos acima.

Agora você, meu caro leitor, deve estar se perguntando, “mas que diabos isso tem a ver com meu contrato de trabalho?”

Eu explico, lembra que comentei no início deste texto? As piadas e os comportamentos estranhos? Pois é, o sentimento que você tem ao ser “atingido” por estas situações, são o dano moral, que você pode ser indenizado, a depender do contexto prático.

E saber o porquê de você poder ser indenizado? Simples, os direitos de personalidade tutelam a pessoa, tanto no seu aspecto corporal, interior e exterior[2], além disto, a Constituição Federal de 1988, trouxe consigo o direito das pessoas a serem reparadas em caso de dano moral[3].

Neste momento, é preciso fazer um alerta, o dano moral existe independente de qualquer outro elemento, ou seja, a pessoa, o agente, não precisa ter sofrido um dano patrimonial, por exemplo, para se reparado por um dano moral, são institutos independentes e que coexistem.

Aliás, é o que se extrai da leitura do artigo 186 do Código Civil[4], o dano moral puro, merece ser amplamente reparado, digo mais, além de amparado, ele deve ser evitado, pela sociedade e, no nosso conceito trabalhista, pelas empresas.

O leitor já pode ter notado que o dano moral então, é de difícil caracterização, afinal, ele diz respeito ao íntimo da pessoa, diz respeito aquilo que não pode ser medido, tangido, quantificado, e, por conseguinte, o próprio direito encontra uma dificuldade em traduzir um conceito do que é dano moral.

Segundo Mauro Schiavi[5] “muitos conceitos partem da definição por exclusão do dano patrimonial, vale dizer: todo dano que não é patrimonial, é moral, ou extrapatrimonial. Não obstante, nem tudo que não é dano patrimonial pode ser encarado como dano moral”.

No nosso sentir, a afirmação acima é verdadeira, mas torna a explicação de dano moral demasiadamente complicada, ou seja, traz para o leitor uma definição difícil de compreender.

Para desmistificar, vamos trazer, novamente, um exemplo: memes, uso da imagem sem autorização, por mais que o uso não traga qualquer repercussão vexatória, o seu uso é passível de indenização, como aliá, já foi[6], no caso citado, a pessoa se sentiu moralmente ofendida e, portanto, foi indenizada.

Dito isto, podemos concluir que o dano moral protege as lesões no mundo interior (honra, intimidade, privacidade) e exterior (imagem, boa-fama, estética), por isto, no caso acima, foi reconhecido o direito a uma indenização.

É sempre importante lembrar que o conceito de dano moral, agora chamado pela CLT de dano extrapatrimonial[7], não pode ser vista como uma situação rígida, fechada, estática, afinal, como já demonstrado, o dano moral trata do íntimo das pessoas e, não pode a lei querer tratar de todas as hipóteses.

Aliás, o Enunciado nº: 19, da II Jornada Nacional de Direito Material e Processual do Trabalho da ANAMATRA, o qual trago aqui na íntegra, fala a mesma coisa:

DANO EXTRAPATRIMONIAL: EXCLUSIVIDADE DE CRITÉRIOS Aplicação exclusiva dos novos dispositivos do título II-a da CLT à reparação de danos extrapatrimoniais decorrentes das relações de trabalho: inconstitucionalidade. A esfera moral das pessoas humanas é conteúdo do valor dignidade humana (art. 1º, III, da CF) e, como tal, não pode sofrer restrição à reparação ampla e integral quando violada, sendo dever do Estado a respectiva tutela na ocorrência de ilicitudes causadoras de danos extrapatrimoniais nas relações laborais. Devem ser aplicadas todas as normas existentes no ordenamento jurídico que possam imprimir, no caso concreto, a máxima efetividade constitucional ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 5º, V e X, da CF). A interpretação literal do art. 223-A da CLT resultaria em tratamento discriminatório injusto às pessoas inseridas na relação laboral, com inconstitucionalidade por ofensa aos arts. 1º, III; 3º, IV; 5º, caput e incisos v e x e 7º, caput, todas da Constituição Federal[8].

Ou seja, a letra fria da lei, serve de um norte, mas não pode ser vista como uma exaustão do tema, afinal, é humanamente impossível que se tenha uma regra para todos os casos possíveis de indenização por danos extrapatrimoniais.

E, para finalizar o artigo, mas não o tema, volto a falar sobre as piadas jocosas e o comportamento duvidoso, sabe onde é possível encontrar o fundamento para a indenização por dano extrapatrimonial na CLT? Art. 223-B “causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são titulares exclusivas do direito à reparação”.

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[1] Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

[2] SCHIAVI, Mauro. Manual Didático de Direito do Trabalho – Salvador: Editora JusPodvim, 2021, p.614

[3] Art. 5º, incisos V e X.

[4] Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

[5] SCHIAVI, Mauro. Manual Didático de Direito do Trabalho – Salvador: Editora JusPodvim, 2021, p.615

[6] Justiça condena dono de perfil de humor a indenizar idoso em R$ 100 mil por uso indevido de foto que virou meme | Goiás | G1 (globo.com)

[7] A nomenclatura foi alterada pela Reforma Trabalhista, Lei 13.467/2017, que trata no Título II – A, DO DANO EXTRAPATRIMONIAL, vai do artigo 223-A até o 223-G.

[8] Encontrado em Enunciados aprovados jornada e conamat.indd (anamatra.org.br)

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